O Pai


Terra de semente inculta e bravia,
terra onde não há esteiros ou caminhos,
sob o sol minha vida se alonga e estremece.


Pai, nada podem teus olhos doces,
como nada puderam as estrelas
que me abrasam os olhos e as faces.


Escureceu-me a vista o mal de amor
e na doce fonte do meu sonho
outra fonte tremida se reflecte.


Depois... Pergunta a Deus porque me deram
o que me deram e porque depois
conheci a solidão do céu e da terra.


Olha, minha juventude foi um puro
botão que ficou por rebentar e perde
a sua doçura de seiva e de sangue.


O sol que cai e cai eternamente
cansou-se de a beijar... E o outono.
Pai, nada podem teus olhos doces.


Escutarei de noite as tuas palavras:
... menino, meu menino...


E na noite imensa
com as feridas de ambos seguirei.


Pablo Neruda, in "Crepusculário" Tradução de Rui Lage


Este poema é dedicado ao meu pai, que partiu há mais de dois anos ...

Comentários

Mensagens populares deste blogue

Hoje sou pequenina ...

O Teu Olhar nos Meus Olhos